quarta-feira, 30 de maio de 2012

Novo artigo 135-A: condicionamento de atendimento médico hospitalar emergencial 

 

 Objetividade jurídica: A Lei 12.653/12 acrescentou à Parte Especial do CP, mais precisamente no Capítulo III (Da periclitação da vida e da saúde), a mais nova forma de omissão de socorro, praticada mediante o condicionamento de atendimento médico hospital emergencial, punida com 3 meses a 1 ano, e multa (infração penal de menor potencial, salvo na forma qualificada pela morte). A tipificação dessa prática rotineirajá era esperada. Vejamos. O Código de Defesa do Consumidor, desde 1990, preceitua que a exigência da garantia para o atendimento é prática abusiva que expõe o consumidor a desvantagem exagerada, causando desequilíbrio na relação contratual (art. 39). No mesmo espírito, o Código Civil de 2002 garante ser anulável o negócio jurídico por vício resultante de estado de perigo (art. 171, inc. II). A Resolução Normativa 44 da Agência Nacional de Saúde Suplementar, por sua vez, desde 2003, no seu art. 1º, já alertava: Art. 1º Fica vedada, em qualquer situação, a exigência, por parte dos prestadores de serviços contratados, credenciados, cooperados ou referenciados das Operadoras de Planos de Assistência à Saúde e Seguradoras Especializadas em Saúde, de caução, depósito de qualquer natureza, nota promissória ou quaisquer outros títulos de crédito, no ato ou anteriormente à prestação do serviço. Haverá, certamente, doutrina questionando a necessidade de intervenção do Direito Penal. Contudo, é sabido que o princípio da intervenção mínima tem como importante característica a subsidiariedade, ficando a intervenção do Direito Penal condicionada ao fracasso das demais esferas de controle. O comportamento em exame (evidentemente ilícito) não vinha sendo combatido eficazmente pelos demais ramos, aumentado, a cada dia, os casos de constrangimentos aos consumidores, forçados a garantirem o hospital para receberem atendimento de urgência. Justifica-se, portanto, a nosso ver, a incriminação do fato. 

 Sujeitos do crime:O crimepode ser praticado por administradores e/ou funcionários do hospital. Figura como vítima a pessoa em estado de emergência. Conduta: Consiste em negar atendimento emergencial, exigindo do potencial paciente (ou de seus familiares), como condição para a execução dos procedimentos de socorro: a) cheque caução (cheque em garantia), nota promissória (promessa de pagamento) ou de qualquer garantia (endosso de uma duplicata ou letra de câmbio, por exemplo). b) o preenchimento prévio de formulários administrativos, quase sempre na forma de contratos de adesão favorecendo abusivamente uma das partes (o hospital). O agente, no caso, aproveita-se de um momento de extrema fragilidade emocional do doente (ou de seus familiares) para, mediante a uma das indevidas exigências acima descritas, garantir para hospital o ressarcimento das despesas realizadas no socorro. A solicitação de garantia, sem condicionar o atendimento, é fato atípico. 

 Tipo Subjetivo: Somente se admite a forma dolosa. 

Consumação e tentativa: Consuma-se com a indevida exigência, sendo possível, em tese, a tentativa (delito plurissubsistente). 

A doutrina, como já acontece nos demais crimes de perigo, discutirá se o delito em exame é de perigo abstrato (perigo absolutamente presumido por lei) ou concreto (perigo deve ser comprovado), lembrando que o STF, recentemente, decidiu que a criação de crimes de perigo abstrato não representa, por si só, comportamento inconstitucional por parte do legislador penal (HC 104.410/RS). Nos termos de que dispõe o parágrafo único, a pena é amentada até o dobro se da negativa de atendimento resulta lesão corporal de natureza grave (§§ 1º e 2º do art. 129), e até o triplo se resulta a morte. Trata-se de figura preterdolosa (ou preterintencional), sendo os resultados majorantesdecorrentes de culpa.

(Rogério Sanches Cunha)

Nenhum comentário:

Postar um comentário